Decisão, que ainda precisa ser analisada pela Quinta Turma do STJ, é considerada, por diversas organizações de proteção à liberdade de imprensa e de expressão, como um risco à proteção dos jornalistas e comunicadores no país.
No dia 5 de julho de 2012, o jornalista esportivo Valério Luiz de Oliveira foi assassinado, com seis tiros à queima-roupa, na porta da rádio que trabalhava, em Goiânia. As investigações da Polícia Civil do Estado de Goiás concluíram que o mandante do crime foi o então Tabelião e Presidente do Atlético Clube Goianiense, Maurício Borges Sampaio.
O crime foi motivado, segundo conclusão das investigações da polícia goiana, pelas críticas que o jornalista desferia contra o desempenho da agremiação esportiva nos campeonatos goiano e brasileiro de 2012. Já a execução do homicídio foi efetivada por membros do Comando de Missões Especiais 2 (CME2), cujos membros trabalhavam, nas horas vagas do quartel, como seguranças particulares de Sampaio. Mais de 10 anos foram necessários para levar os réus a julgamento pelo Tribunal do Júri de Goiânia, que os condenou em novembro de 2022.
Nesse meio tempo, o “Caso Valério Luiz” se tornou emblemático na luta pela liberdade de imprensa e de expressão no país, chegando a ser utilizado como caso representativo perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos em outubro de 2015, durante audiência temática que discutia a impunidade dos crimes e violações cometidos contra jornalistas e comunicadores no Brasil.
Segundo a ABRAJI, o Brasil é o 10º no ranking mundial da impunidade nos assassinatos de jornalistas. Para ABRAJI, Instituto Vladimir Herzog, Artigo 19, FENAJ e Repórteres Sem Fronteiras, a decisão da Ministra pode contribuir para tal estatística, já que lança uma sombra sobre o Caso Valério Luiz, que poderá nunca ter uma decisão de mérito.
A decisão anulou o Júri Popular, finalizado em 2022, com base em uma audiência ocorrida ainda em 2015. Segundo Habeas Corpus da defesa de Maurício Sampaio, um de seus comparsas foi ouvido em juízo sem a presença dos advogados dos outros acusados.
Os Ministérios Públicos Estadual e Federal sustentam, no entanto, que a referida audiência se deu precisamente pelo direito de defesa do comparsa de Sampaio, que estava preso preventivamente e pediu que fosse levado à presença do juiz a fim de arrazoar pela sua liberdade, que foi concedida.
Ainda que tal audiência tenha se dado para a apreciação de um pedido de liberdade, e que seu conteúdo, portanto, não tenha sido utilizado para fundamentar a condenação de Sampaio no Tribunal do Júri, a Ministra Daniela Teixeira anulou a decisão do corpo de jurados de Goiânia. O Ministério Público informou que irá recorrer da anulação.
Somente em 2022, a realização do Júri Popular foi adiada 4 vezes, devido a expedientes usados pela defesa dos acusados, como renúncia de advogados às vésperas do julgamento e abandono de plenário. Uma vez condenados, os réus moveram recurso de apelação contra a sentença, e o julgamento das apelações havia se iniciado no último dia 27 de fevereiro, quando foi interrompido por pedido de vistas de um dos desembargadores do Tribunal de Justiça de Goiás.
Antes que o julgamento pudesse continuar, contudo, sobreveio a decisão da Ministra. Atualmente, Maurício Sampaio aguarda o desfecho do processo em liberdade, mas encontra-se afastado da diretoria do Atlético Clube Goianiense e foi destituído do cartório que ocupava na capital goiana em razão de atos de improbidade administrativa. Pelas irregularidades cometidas no cartório, Sampaio está definitivamente condenado a ressarcir o erário estadual em mais 170 milhões de reais.
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