Novo ministro da Justiça tem o time e o timing adequados; é só entrar em ação, escreve Demóstenes Torres
Este milênio vem sendo de grandes demonstrações de coragem e sabedoria. Contamos com ambas para que surja vacina contra um mal que tem crescido nas últimas 4 décadas, a criminalidade violenta.
Com maior ou menor eficácia, os diversos governos tomaram providências. Apesar disso, a intranquilidade se manteve em ascensão. Tamanha é a supremacia alcançada por traficantes, assassinos, estupradores e assaltantes que passou a ser vista como normal.
É normal só se sentir seguro em carro blindado. É normal conviver com 50.000 assassinatos por ano, somando os alheios às estatísticas. É normal ter a casa arrombada. É normal se despedir antes de sair para o trabalho como se não fosse voltar. É normal tirar relógio, colar, aliança ou jaqueta para ir ao mercadinho da esquina.
É normal o domínio das facções, ditando ordens de dentro das cadeias, do meio da favela e na piscina da mansão do dono do morro. É normal haver tribunal do crime, pedido de licença para entrar na comunidade e pedágio para pobres como mototaxistas e entregadores. É normalíssimo tomarem o seu celular.
Anormal é insistir no fingimento. Já se sabe o que funciona e o que é enrolação, o que desacorçoa o marginal e o que o entusiasma, o que deixa as pessoas de bem trancadas e seus algozes curtindo a vida adoidados. Então, por que dar murro em ponta de faca em vez de nocautear o problema?
Em seus mandatos anteriores, Lula entrou nesse jogo de frases batidas, de faz de conta, brincando de deixa que eu deixo com os Estados. Nomeou ministros honrados para a Justiça: Márcio Thomaz Bastos, Tarso Genro e Luiz Paulo Barreto. E as ruas do Brasil permaneceram mais inseguras que as de Bagdá e Gaza.
Agora, no 3º mandato, chegou dando voadora no pescoço dos malfeitores ao escolher Flávio Dino, que vai para o Supremo Tribunal Federal, e Ricardo Lewandowski, recém-saído de lá.
Dino fez o que pôde, entretanto, o ministro pode muito pouco. A burocracia é superior a ele. Dos R$ 17 bilhões destinados à Segurança Pública em 2023, foram gastos R$ 14 bilhões e R$ 2,7 bilhões acabaram destinados à atividade-fim, o policiamento. A administração geral absorveu 57,29% do dinheiro, precisamente R$ 7.823.418.277,86. São informações do Portal da Transparência da Controladoria-Geral da União.
O portal exibe ainda outro dado interessante: o orçamento do Ministério da Cultura para o ano passado foi de R$ 3 bilhões. Sim, é maravilhoso morar num país que investe mais na cultura que no policiamento, todavia o caso aí é típico do Custo Brasil, nada a ver com a competência dos ministros e seus auxiliares.
Portanto, o substituto herda desafios imensos, o que nos remete ao binômio caracterizador do milênio: coragem e sabedoria. Lewandowski dispõe de ambas, com 2 plus, o conhecimento e a integridade moral, quarteto que caracteriza também o atual ocupante. Vai precisar de tudo isso, pois na Polícia Federal, vitrine-mor da pasta, os números da CGU são implacáveis.
Em 2023, a PF conseguiu R$ 8.797.860.313,18. Dos quase R$ 9 bi, o policiamento teve R$ 643.316.913,39, cerca de 4 vezes menos que a Previdência Social de seus servidores, R$ 2.596.013.276,53, e um pequeno naco do ancorado na administração geral, R$ 4.343.263.276,68. Para comparação, a Polícia Militar do Ceará dispôs de R$ 2 bilhões em 2023 para pessoal e encargos.
Lula convenceu o profissional certo para o local apropriado. Resta-lhe fornecer as condições: base no Congresso criando e modificando a legislação, prestígio quando enfrentar as corporações, Forças Armadas bem equipadas tornando inexpugnáveis as divisas e a Costa brasileiras, ideologia se rendendo à prática, recursos inéditos e rápidos.
Dentre os colegas de 1º escalão, Lewandowski vai precisar diuturnamente de Wellington Dias (Social), André Fufuca (Esporte), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), Margareth Menezes (Cultura), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) e, principalmente, do quarteto em si Fernando Haddad (Fazenda), Camilo Santana (Educação), Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio) e José Múcio (Defesa). E não vai apenas precisar, vai depender da relação pessoal com Lula, tão fundamental quanto respirar, o que ninguém almeja com faca cravada na garganta.
Quando subir morro, entrar em favela e peitar invasão, tem de estar municiado também de livros, notebooks, internet que funciona, cursos profissionalizantes, uniforme e materiais escolares, financiamento para microempresas e agricultura familiar, instrumentos musicais, ginásios poliesportivos, piscina e todas as bolsas possíveis e imagináveis. A chance de o pobre se defender é dispondo do arsenal da cidadania. Chega de ser atingido no peito por desemprego, algema e bala perdida.
Onde o poder público está, com estrutura e honestidade, o crime sai. Todavia, não sai para atender a pedidos, não sai por ser bonzinho e não sai por medo. Sai porque a mão pesada do Estado vai pegá-lo e esmagar seus privilégios.
O quadro de momento é aterrador e a resposta deve ser de igual monta. Encarar com dureza o tráfico de drogas e de armas. Ter a ousadia de descriminalizar a atividade eventual do pequeno traficante e se concentrar no graúdo. Discernimento em temas espinhosos: uma coisa é a população contar com arma para proteger sua família e seus negócios; outra é tolerar revólver, espingarda, pistola, escopeta, fuzil, metralhadora e até míssil a tiracolo dos bandidos.
Será vital Lewandowski dispor de liberdade legal e popular ao partir para cima dos marginais, retomar o controle dos territórios administrados por facções e milícias, implantar GLO (Garantia da Lei e da Ordem) no Rio de Janeiro e nas fronteiras, dar tratamento especial para os chefões e aplicar sem dó medidas excepcionais em situações excepcionais.
Lewandowski deve confrontar a maioria da imprensa, a que serve de valhacouto de facínoras. Agir como o prefeito carioca Eduardo Paes, o destemido cuidador dos dependentes químicos, mesmo quando perdem a capacidade de discernir a hora do tratamento. O fisiologismo defende o uso incessante de crack? Eduardo Paes rebate com internação compulsória a quem dela necessita.
Outra situação que deve sair do queridismo é a dos chamados povos originários. Em 1979, li um artigo denunciando que havia garimpeiro em terra yanomami dos 2 lados, Brasil e Venezuela. Continua como antes, sem paraíso, só inferno depois de um purgatório com Funai, ONGs e 1.000 espertalhões. A solução é simples como escavar uma árvore e nela flutuar igarapé abaixo: deixem o indígena ganhar dinheiro e comprar canoa com motor.
Lula começou a fase 3 pelo estrangeiro e Lewandowski será tributário dessa vocação. Não há como combater o tráfico internacional sem ajuda dos vizinhos. Se legalizar uma droga aqui, vem meio mundo para cá consumir, tipo Holanda. Liberação atabalhoada redunda no modelo Nova York, com ônibus de usuários rumo ao fumacê. Lacrar as fronteiras é um ato coletivo.
A equipe anunciada transforma o ministério de Lewandowski em um superbunker, uma sala da justiça, com heróis de carne, osso e musculatura política e técnica.
Manoel Carlos de Almeida Neto, novo nº 2 como secretário-executivo, tem estofo para cargos e funções altos exigidos pela sociedade. Cotado para integrar o STF, estaria sendo um excelente ministro, como bem se porta Cristiano Zanin. Porém, a tranquilidade em milhões de lares brasileiros clamou de forma decisiva por sua atuação.
O secretário nacional de Segurança Pública será Mário Sarrubbo, que nos dá esperança por vir de ótima gestão no Ministério Público de São Paulo. A chefe de Gabinete, Ana Maria Alvarenga, é a certeza de um desempenho vitorioso, repetindo o êxito de anos a fio no Supremo.
Alguns podem imaginar que Lewandowski e Sarrubbo, egressos da magistratura e do MP, vão passar pano em cabeça de vagabundo. Superei essa desconfiança quando deixei a Procuradoria Geral de Justiça de Goiás para assumir a Secretaria Estadual de Segurança Pública e Justiça. Pelo contrário. Fui firme, contei com o apoio do então presidente da República (Fernando Henrique) e do governador (Marconi Perillo), as polícias agiram de forma brilhante, a sociedade colaborou e melhoramos todos os índices. Assim ocorreu também com Alexandre de Moraes, que deixou o MP e foi bem-sucedido na Segurança e Justiça de São Paulo e saiu do Ministério da Justiça para ser linha-dura no STF.
Lula e Lewandowski têm o time (a equipe) e o time (o tempo) adequados. Falta entrarem em ação –sem luzes nem câmeras.
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