Luciano Martins*
O orçamento público brasileiro, que consome 33% do Produto Interno Bruto (PIB) — algo em torno de R$ 3 trilhões anuais —, reflete, em suas entrelinhas, as escolhas e prioridades de cada governo. Mais do que cifras, o direcionamento desses recursos expõe as políticas de Estado, destacando áreas que recebem maior investimento e, ao mesmo tempo, denunciando setores que operam com recursos limitados diante de demandas crescentes. Neste cenário, o Judiciário e a Segurança Pública emergem como elos complementares e interdependentes do sistema de justiça penal, mas que enfrentam realidades distintas no que tange à alocação orçamentária.
O Judiciário, alicerce do Estado Democrático de Direito, é responsável pela resolução de conflitos, aplicação da justiça e pelo cumprimento das penas. Recebendo 1,5% do PIB (R$ 150 bilhões), grande parte de seu orçamento é destinada ao custeio de pessoal ativo e inativo, o que evidencia uma estrutura robusta, mas também suscita questionamentos sobre a eficiência de sua gestão. Apesar de sua importância inquestionável, a morosidade processual, o excesso de demandas e a falta de modernização ainda desafiam a efetividade da justiça e, por vezes, comprometem a confiança da sociedade no sistema.
Por sua vez, a Segurança Pública, que opera na preservação da ordem, seja de forma preventiva ou repressiva, dispõe de 1,3% do PIB (R$ 130 bilhões). Embora responsável por atuar na linha de frente do combate à criminalidade, suas limitações orçamentárias são evidentes: falta estrutura, capacitação, tecnologia e investimento em políticas que tratem as causas e não apenas os sintomas da violência. Quando falha a Segurança Pública, o Judiciário é sobrecarregado. Quando falha o Judiciário, a impunidade enfraquece o papel da Segurança. Esse abismo entre as pontas escancara uma verdade: o sistema é tão forte quanto seu elo mais frágil.
O que está em jogo, portanto, não é apenas a diferença de recursos, mas a gestão e distribuição desses investimentos. Cada governo, ao definir suas prioridades, escolhe a quem e como servir. Políticas públicas robustas de Segurança deveriam priorizar o investimento em prevenção, ampliando o acesso à educação, oportunidades de emprego e à urbanização de territórios vulneráveis. No Judiciário, a modernização de processos, o incentivo à conciliação e à digitalização podem reduzir custos e, sobretudo, devolver agilidade ao sistema. Em ambos os casos, a pergunta central permanece: os investimentos atuais refletem as necessidades reais da sociedade?
A distorção orçamentária, ao privilegiar o custeio em detrimento de investimentos estruturantes, reforça um ciclo de ineficiência. Enquanto as forças de segurança se veem limitadas pela falta de recursos, o Judiciário absorve processos de uma sociedade onde o crime, em grande parte, é reflexo da ausência de políticas preventivas eficazes. O resultado? Um sistema que lida constantemente com as consequências, mas que raramente trata suas causas.
Nesse contexto, a eficiência da gestão orçamentária torna-se um desafio incontornável. É preciso ir além da mera comparação numérica e questionar como esses recursos podem ser melhor distribuídos e aplicados, de modo que as instituições se fortaleçam em suas funções complementares. A escolha entre manter estruturas ou transformá-las por meio de políticas estratégicas é, em última análise, uma escolha de governo e de visão de Estado.
Ao cidadão, cabe exigir não apenas transparência, mas resultados. As instituições públicas, sejam responsáveis por proteger ou julgar, devem estar alinhadas no compromisso de construir uma sociedade mais justa e segura. O orçamento, mais do que um retrato das despesas, é a medida de nossas prioridades enquanto nação.
Sem um compromisso claro com políticas que ataquem as raízes dos problemas, e não apenas suas manifestações, continuaremos reféns de um sistema que privilegia a manutenção da burocracia em vez da transformação estrutural. É imperativo que as escolhas orçamentárias reflitam um pacto nacional por segurança, eficiência e justiça, onde cada real investido represente um avanço concreto para a sociedade. O Brasil precisa superar o dilema do improviso e adotar uma visão de longo prazo, em que governar não seja apenas administrar crises, mas, sobretudo, construir soluções duradouras.
* Luciano Martins é advogado, professor e vice-presidente da União Brasileira de Apoio aos Municípios (UBAM) no Estado de Mato Grosso do Sul. Atuou como secretário-adjunto de Governo, controlador-adjunto e diretor-presidente da Fundação Social do Trabalho no Município de Campo Grande (Funsat).
Relacionadas
Papai Noel embarca em AS350 Esquilo no Aeroporto de Maricá para entregar presentes a 400 crianças
Claudia Leitte troca lemanjá por Jesus e irrita Ivete Sangalo
Ônibus do Rio terão ar condicionado monitorado pela prefeitura