É preciso investigar com rigor a promiscuidade entre empresas de pesquisa, partidos e candidatos, com reprimenda no bolso e na liberdade
Se as pesquisas estivessem corretas, quem teria sido o vencedor na eleição municipal em sua cidade? Onde moro, Goiânia, havia delas para todos os gostos, gastos e gestos. Acabou que o 1º colocado, Fred Rodrigues, sequer transitava entre os favoritos. O portal de notícias Poder360 publicou uma tijolada, na 2ª feira (7.out.2024): “Compare o resultado das urnas com pesquisas nas 10 maiores capitais”. Imagine no interior…
Os escândalos seriam de dar cadeia num país sério. Na antevéspera, a AtlasIntel deu 19% a Ricardo Nunes, o prefeito que tenta a reeleição em São Paulo.
Da apuração, Nunes saiu com 29,48%, aproximadamente 10 pontos percentuais e 50% a mais do que o instituto havia indicado. Enquanto isso, Datafolha e Quaest, na véspera da votação, viram o apresentador José Luiz Datena com mais que o dobro do obtido, falha igual à que a Atlas cometeu em favor da economista Marina Helena: falou 4, vieram 2. Por 1 voto se pode decidir quem vai administrar 12 milhões de pessoas da megalópole, 1% é coisa demais para se aceitar.
Nos grotões, as notícias são assustadoras. Nada a fazer. As vítimas procuram socorro no Ministério Público Eleitoral e no Congresso, já estive em ambos e fui incessantemente procurado. Nada havia a fazer. Contratam advogados. Nada podem fazer.
Será que realmente nada há a fazer? CPIs e operações policiais, que geralmente não dão em nada, não dão em nada porque são feitas para darem em nada. Flagram um bagrinho aqui, uma piabinha depõe acolá, 2 lambarizinhos indiciados no raso, porém nada de profundo. Os grandões estão por aí tão ricos quanto impunes, contratantes e contratados.
Existem critérios, todos mais frouxos que calça de palhaço. Os algozes devem rir de exigências “duríssimas” como ter de registrar a pesquisa, com lapso temporal para exibir os dados… Um circo, na pior acepção do termo.
Sobram sugestões, como impedir a divulgação dos levantamentos na semana ou até na quinzena da eleição. Ou responsabilizar eleitoral e penalmente em casos de erros grotescos, com indenizações imensas, calculadas pelo orçamento do órgão pretendido. O problema é que para isso passar no Congresso seria necessário convencer centenas de beneficiários das patacoadas (ou delitos) das empresas.
Os perdedores estão sem mandato, pois a tática é a de sempre: elas vão inflando os números, a massa se rende a quem está com mais possibilidade de vitória e os compradores dos índices acabam próximos deles. E, ainda assim, alguns se espatifam ante a vontade popular.
Dentre as tabelas comparativas do Poder360 está a referente a Porto Alegre. A poucas horas de digitarem seu binário predileto, os gaúchos viram as informações da Atlas: Sebastião Melo 35%, Maria do Rosário 29%, Juliana Brizola 25%. O eleitor foi forçado a crer num empate triplo ou algo putrefato parecido.
Na verdade, o atual prefeito obteve 49,72%, Rosário 26,28% e Brizola, 19,69%. A outro concorrente, Felipe Camozzato, previu 8% e ele não chegou à metade disso. É óbvio que influenciou o resultado. Melo ficou a mísero 0,28 ponto percentual de vencer em 1º turno numa cidade que precisa de estabilidade, inclusive política, para se levantar com urgência das tragédias que a tantos prejudicaram. Sem o tropeço (ou trapaça) das empresas, nem haveria 2º turno contra quem recebeu uma ajudinha de 3,72%.
Por ser ciência, a estatística oferece técnicas seguras para captar dados. O que as empresas fazem com eles é que são elas. O entrevistado troca de humor entre o momento em que é abordado e o da votação? Sim, mas é necessário ser idiota para acreditar em mudanças tão bruscas que destroçam os 8% de Camozzato na pesquisa e os entregam esmagados nos 3,83% que apareceram nos boletins do Tribunal Eleitoral.
E os equívocos são democráticos, esquartejam sem olhar ideologia. Camozzato é do direitista Novo. O prefeito de Recife, João Campos, do esquerdista PSB, deitou em 68% e acordou com 78,11%.
Incompetência ou crime? Quando o velho e bom (para alguns) Ibope dominava os recolhimentos de opinião, o Brasil sabia quem era o dono (Carlos Augusto Montenegro) e que, em caso de diferenças gritantes, nem precisaria gritar, ele viria a público oferecer explicações.
Incompetentes ou criminosos, seus sucessores no ramo estão exatamente nem aí para Sua Excelência, a democracia. Sim, em último caso, é ela a esfaqueada nas costas.
Há o que fazer. A distância da eleição é um dos itens, talvez de 10 dias. Punir criminalmente a discrepância, se premeditada. Investigar com rigor a promiscuidade entre empresas de pesquisa, partidos e candidatos, com reprimenda no bolso e na liberdade. Afinal, o que está em jogo é a diferença entre a bola bater na trave na decisão da Copa do Mundo e adiar o sonho por 4 anos ou ultrapassar a linha do gol. Sem VAR.
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