Há quase 50 anos, a medicina experimentava as primeiras aprovações por agências reguladoras de medicamentos voltados a combater a obesidade, sabidamente responsável por aumentar os riscos de doenças cardiovasculares como infarto, acidente vascular cerebral (AVC) e demais episódios que podem ser incapacitantes e levar à morte. Até os anos de 2010, as tentativas de reduzir o peso para proteger o coração e toda sua complexa rede fracassaram diante de efeitos colaterais avassaladores. Depressão, ataques cardíacos e ideações suicidas fizeram com que obesos dependessem da combinação de exercícios e dieta, cirurgia bariátrica ou de medicações com impactos sutis para evitar e reduzir danos ao órgão e artérias. Mas um divisor de águas pode estar se aproximando com os novos medicamentos desenvolvidos para o tratamento de diabetes e que já são usados para obesidade estão demonstrando potencial para a proteção da saúde cardiovascular, reduzindo a pressão arterial e evitando o acúmulo de gordura nas artérias (aterosclerose).
Na última semana, o fármaco semaglutida esteve no centro dos principais painéis do congresso da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC, na sigla em inglês), realizado em Barcelona, na Espanha, como uma droga a entrar no rol de indicações de especialistas para atacar o problema.
Na última década, estudos têm ajudado a consolidar a ideia de que eventos cardiovasculares, diabetes tipo 2 e obesidade formam um triângulo a ser enfrentado conjuntamente e que as estratégias de tratamento não devem permitir que nenhum dos lados fique descompensado. Até então, o desafio parecia difícil de ser enfrentado. Os remédios voltados para diabetes eram como uma bomba para o coração e a ciência precisou aprofundar as pesquisas sobre novas opções de drogas a partir de 2008, quando a agência reguladora americana Food and Drug Administration (FDA) determinou que a indústria farmacêutica implementasse meios para evitar o risco cardiovascular nessa classe de medicamentos. Com o avanço do trabalho baseado nessas diretrizes, houve o advento das substâncias que atuam em receptores de hormônios produzidos pelos intestinos, como o GLP-1, importante para a regulação do apetite e um redutor do ritmo de esvaziamento do estômago, algo que aumenta a duração da sensação de saciedade. A partir disso, uma reação em cadeia começou a surpreender os pesquisadores.
A semaglutida se mostrou eficaz contra a diabetes, mas os pacientes também passaram a ter uma perda de peso que atingiu 17% na dosagem de 2,4 mg aplicada uma vez por semana. E os estudos mais recentes apontam que o coração acaba sendo beneficiado nesse processo. “É uma droga para diabetes que tem ações indiretas na redução da pressão arterial, do peso, diminui a inflamação do organismo e tem ação antiaterosclerose”, detalha Marcelo Assad, presidente do departamento de aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Os benefícios cardiovasculares em pacientes com diabetes foram comprovados em um estudo com 4.807 pessoas publicado em 2018. Entre os efeitos colaterais, estão: náusea, diarreia e vômitos.
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