O Brasil vive um momento decisivo na agenda global do clima e da transição energética. Às vésperas da COP 30, o país reafirma sua responsabilidade de liderança ambiental, enquanto busca consolidar um novo modelo de desenvolvimento capaz de conciliar crescimento econômico, justiça social e conservação dos ecossistemas. Essa transição, contudo, exige mais do que o avanço tecnológico: requer uma profunda transformação na forma como compreendemos o território, o uso dos recursos e o papel do Estado no planejamento sustentável.
Nesse contexto, o Amapá desponta como um território de relevância estratégica singular. Com indicadores de cobertura vegetal preservada elevadíssimos e um dos maiores contínuos de manguezais do planeta, o estado concentra biomas que conectam floresta, cerrado e ecossistemas costeiros, constituindo um verdadeiro laboratório natural para a inovação ecológica e climática. É nesse espaço que o debate sobre transição energética e exploração de petróleo assume contornos complexos e decisivos. A questão central não se resume à possibilidade de exploração, mas à forma como ela ocorrerá e ao legado que deixará para as próximas gerações.
Dessa forma, as Soluções Baseadas na Natureza (SbN) ganham força nesse cenário como instrumentos estratégicos para alinhar desenvolvimento e sustentabilidade. Partindo da premissa de que a própria natureza oferece respostas eficientes e economicamente viáveis aos desafios humanos, as SbN englobam práticas como restauração florestal, manejo de bacias hidrográficas, agricultura regenerativa, conservação costeira e valorização de serviços ecossistêmicos.
No Amapá, onde a integridade ambiental é um ativo real, essas soluções se tornam fundamentais não apenas para mitigar impactos, mas para regenerar paisagens e gerar valor econômico a partir da conservação. O mercado internacional de créditos de carbono e biodiversidade aponta nessa direção, e o Amapá tem potencial concreto para transformar sua riqueza ecológica em ativo financeiro e social. Entretanto, para que isso se realize, é indispensável planejamento, governança e integração entre políticas públicas, setor produtivo, universidades e comunidades locais.
A chegada de grandes empreendimentos energéticos na região representa um teste de maturidade institucional. Exige do Estado e da sociedade civil uma nova capacidade de coordenação e decisão, capaz de demonstrar que é possível compatibilizar investimentos robustos com sustentabilidade efetiva. Isso implica construir uma carteira estadual de soluções socioambientais, que articule restauração ecológica, gestão de carbono azul, fortalecimento de cadeias produtivas tradicionais, incentivo à bioeconomia e inovação verde, além de educação científica voltada à realidade amazônica. Tais iniciativas devem ir além da compensação ambiental, configurando uma verdadeira infraestrutura viva — uma base que protege, regenera e impulsiona o desenvolvimento de forma equilibrada e duradoura.
Essa transição energética e ecológica, entretanto, não se sustentará apenas em tecnologias limpas. Ela depende de um novo modelo de governança pública, baseado em ciência, transparência e participação social. No caso do Amapá, isso significa fortalecer instrumentos como o Zoneamento Ecológico-Econômico e o Sistema Estadual de Meio Ambiente, criar mecanismos de financiamento climático e adotar indicadores socioambientais que orientem políticas de longo prazo. A gestão pública deve atuar como articuladora estratégica, garantindo continuidade institucional e a integração entre saberes técnicos, comunitários e científicos. Sustentabilidade não se consolida com boas intenções, mas com execução planejada e visão de futuro.
O Amapá tem diante de si uma oportunidade rara: planejar o desenvolvimento antes que ele aconteça de forma desordenada. Sua integridade ecológica, baixo passivo ambiental e forte identidade cultural com a floresta o colocam em posição privilegiada para protagonizar a transição ecológica brasileira. Transformar essa vantagem em política pública significa investir em conhecimento, inovação e monitoramento, reconhecendo que o verdadeiro desenvolvimento amazônico é aquele que não destrói o que o mundo inteiro busca preservar.
O petróleo pode representar um ciclo econômico importante, mas não deve definir o destino do estado. O desafio é transformar esse momento em um ponto de inflexão, no qual o Amapá consolide um projeto de desenvolvimento sustentável de longo prazo, em que a floresta, os rios e os manguezais sejam reconhecidos como ativos estratégicos e não como obstáculos. As Soluções Baseadas na Natureza nos lembram que a tecnologia mais avançada ainda é a própria vida, e que a floresta não representa atraso, mas vanguarda. A transição energética, portanto, só fará sentido se for também uma transição civilizatória — se mudar a maneira como nos relacionamos com os territórios, as pessoas e o tempo. O Amapá pode e deve ser o território onde o Brasil demonstra que desenvolvimento e natureza não são forças opostas, mas partes de um mesmo projeto de futuro, no qual a economia floresce sem desflorestar e o progresso nasce, literalmente, da floresta.
Euridece Pacheco Ruella
Servidora Pública
Cofundadora e Diretora Executiva da Polítika Assessoria
Especialista em Gestão Pública
Mestre em Direito Ambiental e Políticas Públicas
Dama Comendadora da Câmara Brasileira de Cultura
Antonio Roberto de Souza Góes
Capitão do CBM/AP
CEO da Polítika Assessoria
Especialista em Gestão Pública
Pós-Graduado em Segurança Pública




Relacionadas
[VÍDEO] Homem acende cigarro e quase explode posto no Maranhão
Quatro paradas cardíacas em academias de SC levantam alerta sobre riscos do exercício sem avaliação médica
Famoso por caminhadas atrás de onças, ‘Jaguarman’ morre após infarto fulminante no Pantanal